quinta-feira, 4 de junho de 2009

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Foco da vida

Antonio-Alberto Cortez, economista, professor da UFRN e sub-secretário de Pesca e Aqüicultura da SAPE-RN (aacorteze@yahoo.com.br)
O ser humano, desde tempos remotos, interage com o meio ambiente. E não poderia, como criatura da natureza, diferente ser. Servindo-se de suas dádivas, inicialmente alimentares, aprendeu, no processo evolutivo, a tirar proveito dos bens materiais "gratuitos", tanto os renováveis quanto os não renováveis. Aliás, os renováveis se não têm limites quantitativos, por exemplo, a abundância de água, os tem quando se trata da qualidade.É fato que as demandas pelos recursos naturais - há quem afirme que "nenhum recurso é verdadeiramente renovável" - crescem em uma proporção, digamos geométrica, parafraseando Malthus, mas, a necessária reposição dos possivelmente renováveis sequer existe, mesmo numa proporção aritmética. É, portanto, razoável o reconhecimento de que, aproveitando-se dos prodígios da natureza, a conquista e o uso dos recursos naturais pelos humanos resvalaram para o descaso, no passado longínquo, e para a irresponsabilidade, mais recentemente.Não precisa ser especialista para compreender a grande capacidade de recuperação demonstrada pela natureza, e sua "força" ao suportar certos danos. O que mais irrita, portanto preocupa, é o descomprometimento dos humanos com a saúde de sua casa - a aldeia local/global - ao negar-lhe simples analgésicos que, ao serem aplicados ao meio ambiente potencializam e trazem a cura, amplia-se o quadro negativo da sanidade planetária, e uma agressão ambiental menor poderá agigantar-se e tornar-se irreversível, ou de controle extremamente demorado e dispendioso. Mesmo ratificando importantes tratados internacionais e detendo um código ambiental moderno, o Brasil requer ações ambientais consistentes, porém menos ideologizadas e que dispensem interferências nefastas de aventureiros, quer sejam pseudo-capitalistas ou radicais do meio ecológico, ambos useiros do ânimo extremado. Portanto, considerando que o fiel da balança está no meio, os extremos ideológicos precisam, como se estivessem nos pólos, convergirem à linha equatorial, de modo a colaborarem mediante mitigações e compensações com os propósitos do desenvolvimento sustentável e do bem estar social.Posições radicais imprimem assimetrias sociais que, rápida e violentamente, distanciam os estratos menos favorecidos de um mundo descente, confortável e cidadão. Os problemas ambientais, independentemente de suas magnitudes e dos quadrantes onde se estabeleçam, não podem e, salvo engano, manterem-se em esfera individual qualquer, uma vez que constituem desafios sociais, portanto coletivos. Finalizando, creio que políticas ambientais devem ser exercitadas a partir de caminhos que levem a soluções verdadeiras as quais não deveriam esquecer, nos seus meandros, o foco da vida... da vida humana, inclusive.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

CIÊNCIA E TECNOLOGIA NO BRASI

Desafios da ciência e da tecnologia no Brasil, artigo de Marco Antonio Raupp



Por Marco Antonio Raupp - O Estado de São Paulo, 26.5
27 de maio de 2009 15:30
“Importante desafio a ser enfrentado reside na necessidade de aproximação entre o sistema universitário e as atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) nas empresas”
Nos últimos 50-60 anos, a atividade organizada de produção de conhecimento científico estabeleceu-se no País. No centro desse processo estiveram a reforma universitária, institucionalizando a pós-graduação, e a estruturação de um sistema de apoio e financiamento à pesquisa e aos pesquisadores nas universidades e nos centros de pesquisa governamentais.
O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e as fundações de amparo à pesquisa (FAPs) foram e são agentes executores dinâmicos do processo.
Como indicador sinalizando efetivos resultados desse sistema, temos hoje que o Brasil participa com 2% da produção científica mundial - resultado bastante significativo, pois mostra que o nosso sistema básico de produção de ciência está do "tamanho econômico do País", já que esse índice é basicamente o mesmo da participação do produto interno bruto (PIB) brasileiro no (PIB) mundial.
Estabelecida uma plataforma básica importante para ciência e tecnologia (C&T), a responsabilidade de ampliação com qualidade e atenção às demandas e necessidades da sociedade e do desenvolvimento do País, pelo seu bom e pleno funcionamento, é grande. Implica o enfrentamento de desafios que merecerão dedicação e esforços iguais ou maiores do que os já empregados na construção do sistema básico.
Apresento aqui cinco desses desafios, cuja superação é crucial para a saúde e o bom funcionamento do próprio sistema de C&T, para o reconhecimento de sua utilidade pela sociedade e para que as atividades dos cientistas contribuam também para o equilíbrio social e regional no País.
O primeiro deles é a deficiente educação básica e média. A superação desse desafio requer o engajamento da comunidade científica. Não nos podemos furtar à participação, especialmente na questão do ensino das Ciências e das Matemáticas. As nossas melhores universidades devem dar prioridade à formação de bons professores, e em boa quantidade. Isso não vem ocorrendo. Ao contrário, a formação de professores está cada vez mais sendo relegada às mais destituídas de condições e qualidades. Educação de qualidade é o mais importante requisito para a inclusão social.
A ampliação de vagas nas universidades públicas, sem perder a qualidade, é outro grande desafio. A vaga em instituição pública é a que, de fato, está aberta para os filhos da nova classe média - e o atendimento da demanda por profissionais de ensino superior e técnico é condição sine qua non para o desenvolvimento do País. Os 10 mil doutores que o nosso sistema de pós-graduação forma anualmente certamente nos darão condições de garantir essa expansão, especialmente na esfera das universidades tecnológicas e escolas técnicas, tão necessárias.
A ciência brasileira está cerca de 70% localizada na Região Sudeste. Por razões estratégicas e de justiça federativa, é uma situação que não pode perdurar, constituindo um desafio para o planejamento estratégico e para as políticas de C&T. Temos de redirecionar investimentos federais e estimular as FAPs locais, como já vem ocorrendo em alguns Estados.
Em regiões como a Amazônia, o semiárido e a plataforma continental marinha, o conhecimento científico é absolutamente necessário para uma intervenção econômica sustentável. É imperativa a atuação do sistema de ciência, tecnologia e inovação (C,T&I) nessas áreas. Da mesma forma, a expansão desse sistema, contemplando sua atuação nessas regiões, é vital, até para justificar os investimentos da sociedade nas nossas atividades. O aspecto estratégico impõe o desafio de melhor distribuirmos as atividades de C,T&I no País, contribuindo para a superação das desigualdades regionais.
Outro importante desafio a ser enfrentado reside na necessidade de aproximação entre o sistema universitário e as atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) nas empresas. O Brasil já aprendeu a transformar recursos financeiros em conhecimento; agora, precisamos aprender a transformar conhecimento em riqueza. Além do estímulo à participação de pesquisadores em projetos de interesse da empresa, mecanismos como incubadoras de empresas nascentes nas universidades, parques tecnológicos congregando universidades, centros de pesquisas e empresas com interesse em tecnologia e inovação podem ser estimulados por políticas públicas para criar pontes de cooperação, em benefício da economia do País.
Finalmente, menciono o desafio de superar um gargalo que decorre do fato de a C&T ser atividade recente em nosso país, e que é transversal a todas as outras, sua superação sendo importante para a boa fluência de todas as outras superações. Tal é a questão no marco legal para o exercício dessas atividades. Legislações desenvolvidas em outras épocas e situações, voltadas para outros propósitos, são confrontadas e/ou questionadas sistematicamente pelas atividades demandadas pelo desenvolvimento científico e tecnológico do País. São exemplos a coleta de material biológico de nossa biodiversidade, o uso de animais em experimentos científicos, a coleta e o uso de células-tronco embrionárias, as impropriedades legais na cooperação entre entidades científicas públicas e empresas privadas, o regime "ultrarrápido" nas importações de insumos científicos e muitos outros.
Alguns avanços estão ocorrendo, como a nova lei que regulamenta o uso de animais em pesquisa, a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre células-tronco, a Lei de Inovação e a Lei do Bem. Mas entendemos que uma revisão geral para identificação de gargalos - incluindo aí um estudo sobre o status institucional das organizações de pesquisa e o regime de contratação de pessoal, entre outros - torna-se necessária.
Marco Antonio Raupp, matemático, é presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
O Estado de SP, 26/5