terça-feira, 20 de setembro de 2011

Notas históricas sobre a importância da cera de carnaúba


Por José Romero*
Os rios de carnaúba do nordeste brasileiro são encontrados em porções privilegiadas da área semiárida. Espalham-se pelos Estados do Rio Grande do Norte (trechos dos rios Piranhas-Açú e Apodi-Mossoró), do Ceará (trechos dos rios Acaraú e Jaguaribe, Piauí (trechos do rio Parnaíba) e Paraíba (trechos do rio do Peixe, em menor escala, afluente do rio Piranhas-Açú).

A inteligência do homem do sertão fez desenvolver tecnologias próprias que facilitaram o aproveitamento do principal produto obtido da carnaúba: a cera. No final do século XIX, em cidades cearenses como Aracati e Icapuí, localizadas no litoral semiárido, popularizou-se a prensa inventada por cidadão de nome Damásio Barbosa, obtida a partir do aproveitamento de árvores nativas da região seca, como a aroeira.

A pressão exercida pela prensa sobre a  cera de carnaúba permitiu compactação necessária à qualidade do produto sertanejo no mercado externo. Quem dispunha de carnaubais em suas terras era dono de verdadeira fortuna, os quais agregavam valores às combalidas finanças na isolada e atrasada região semiárida de outrora.

O boom econômico da cera de carnaúba nordestina veio com o advento da indústria fonográfica. Os discos primitivos eram confeccionados com o produto obtido a partir da exploração dessa espécie endêmica da flora existentes nas várzeas de alguns cursos d´água existentes no semiárido.

O advento do vinil foi responsável por sensível declínio na importância da cera de carnaúba. A sofisticação e a durabilidade dos discos fabricados a partir desse derivado do petróleo suscitou a substituição dos fabricados a partir da matéria-prima obtida com o pó existente na árvore que margeia alguns rios do sertão nordestino.

Quando do término da primeira grande guerra, assinalou-se dinâmica econômica surpreendente. A cera de carnaúba era exportada principalmente pelos portos de Fortaleza (CE) e Mossoró (RN) (Porto Franco e Porto de Santo Antônio), localizados próximos das áreas naturais nas quais vicejam os carnaubais, embora hoje esteja bastante diminuída a área de ocorrência dessa espécie vegetal.

Nos dias de hoje ainda há certa importância conferida à cera de carnaúba, mas não se compara à extraordinária demanda que no passado fez do produto um dos mais importantes na pauta de exportações de alguns estados nordestinos.

*José Romero Araújo Cardoso, geógrafo, professor adjunto do Departamento de Geografia da UERN.

Fonte: Blog Carlos Escóssia

domingo, 18 de setembro de 2011

Visitantes maltratam baobá centenário


"Iaiá, esse baobá foi teu avô Senador quem plantou. Diz que trouxe a semente lá da África, da outra banda, repetia Joana o que ouvira Senha Liduína contar". A citação, do romance "Luzes de Paris e o fogo de Canudos", da escritora cearense Angela Gutiérrez, é prova de que o baobá centenário da Praça dos Mártires, mais conhecida como Passeio Público, já faz parte da memória de Fortaleza.

Infelizmente, apesar de ser uma das 45 árvores da cidade imunes ao corte, a espécie africana, plantada em 1910 pelo então senador Pompeu, está com o tronco danificado. Alana, Ane, Bianca, Bruno, Diego, Douglas, Ingrid, Yasmin, Patrícia e Paulo são alguns dos vários nomes gravados no baobá. A planta pode atingir até 45 metros e viver até seis mil anos.

A estudante K. S. M., 14, por exemplo, visitava o lugar acompanhada do pai e da irmã. Após tirar algumas fotografias na companhia da árvore robusta, a menina apanhou uma vareta do chão e tentou escrever seu nome na planta, mas, devido à fragilidade do objeto, não conseguiu. "Nunca vi uma árvore desse tamanho, só em filmes. Não sabia que existia uma assim em Fortaleza", afirma. Em relação aos rabiscos na árvore, a garota diz que são interessantes. "É para mostrar que essas pessoas estiveram aqui", comenta.

Os registros, embora sejam uma forma dos visitantes mostrarem que passaram pelo local, podem ser prejudiciais à planta, como explica o engenheiro agrônomo José Wilmar da Silveira, diretor do Departamento Técnico de Urbanização da Empresa Municipal de Limpeza e Urbanização (Emlurb). "Os rabiscos deixam as árvores mais vulneráveis aos fungos, vírus e bactérias. O baobá, mesmo sendo um vegetal forte, pode ser prejudicado por causa desses ferimentos", informa.

Metáfora - Na opinião de Angela Gutiérrez, que também é professora de Literatura da Universidade Federal do Ceará (UFC), a árvore não deveria sofrer nenhum tipo de intervenção por parte dos visitantes, pois é um bem cultural e está localizado numa praça tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). "Louvo o esforço da Prefeitura para que o Passeio Público retorne à vida da cidade, mas, no caso do baobá, deveria haver uma maior fiscalização", opina.

Para a escritora, o baobá do Passeio Público pode ser considerado como uma metáfora do povo africano. "Apesar de todas as condições adversas de sua vinda e do desrespeito à sua dignidade e liberdade, eles aclimataram-se à terra brasileira, mesclaram-se às outras etnias e participaram do florescimento do povo que hoje somos e da cultura de múltiplas faces que criamos", acrescenta Angela.

Consciência - Conforme Luiza Perdigão, titular da Secretaria Regional do Centro (Sercefor), o órgão, em conjunto com a Emlurb, Guarda Municipal e Secretaria de Cultura de Fortaleza (Secultfor), é responsável por manter e fiscalizar a praça. No entanto, a secretária acredita que a própria população deveria preservar os patrimônios da cidade. "É uma responsabilidade também do cidadão de Fortaleza, que deve ser consciente", fala.

De acordo com estudo do Núcleo das Africanidades Cearenses (Nace), da UFC, existem pelo menos sete baobás em Fortaleza. Dentre eles, o do Passeio Público, do Serviço Social da Indústria (Sesi) da Barra do Ceará, do Paço Municipal, do Horto Municipal e o da Universidade de Fortaleza (Unifor).

Fonte: Diário do Nordeste